Psicanálise: da origem ao caso Anna O.

 The Story of Anna O: A Study on Hysteria (1979) – Les Blank Films

A Psicanálise é, ao mesmo tempo, intrigante e envolvente. Ver os diversos caminhos pelos quais passou Sigmund Freud, fundador da Psicanálise como um campo de estudo, que trouxe várias discussões em prol do autoconhecimento humano e a cura advinda disso, é bastante enriquecedor.

Por meio da investigação, a psicanálise busca entender o que está além do que é apresentado, além da fala do paciente, por meio de técnicas clínicas. Para isso, Freud teve alguns tutores e colaboradores. No tratamento o psicanalista analisa a situação/história do paciente, por meio de investigação, a fim de entender as dores do mesmo. Esse psíquico ‘recalcado’, uma vez que venha à consciência e se torne claro para o paciente, pode levar à cura.

Médico neurologista, especialista em psiquiatria pela Universidade de Viena (1881), Freud teve contato com pacientes com problemas nervosos e acreditava que os tratamentos existentes não eram efetivos. A partir daí, Freud inicia um estágio em Paris com o neurologista Jean-Martin Charcot, que tinha bons resultados no uso da hipnose para tratamento de pacientes, considerados histéricos. De volta à Viena, Freud adota essa mesma abordagem com seus pacientes. Assim, é possível identificar o que provocou alteração no estado mental do paciente (sintomas) e, sob efeito da hipnose, o médico auxilia na solução, ou seja, desaparecimento do sintoma físico.

Ainda insatisfeito com os resultados dessa técnica, mais tarde Freud se aproxima do médico Josef Breuer, que reduzia os sintomas nos pacientes apenas questionando sobre suas fantasias e alucinações, tendo a hipnose com um facilitador de acesso às memórias traumáticas, possibilitando eliminar o sintoma. A primeira paciente tratada com sucesso por essa técnica, foi Anna O. e o tratamento foi chamado de método catártico ou associação livre.

Com a evolução do método, Freud passou a dar mais importância aos eventos acontecidos com o paciente na infância, mais especificamente com a sexualidade na infância e, isso gerou desacordo entre Freud e Breuer, que acabaram por se separar e seguir técnicas distintas. Freud segue desenvolvendo, na psicanálise, a investigação com o uso da hipnose, concentração e entrevista, permitindo que o paciente relembrasse os acontecimentos geradores do sintoma e falasse sobre eles. Freud percebe que mesmo sem hipnose, por meio da insistência, poderia ajudar seus pacientes a se lembrarem do gatilho gerador do sintoma, alcançando a cura.  Mais tarde testou a técnica de pressão, não muito aceita pelos pacientes, passando para a associação livre.

Na associação livre o paciente traz para a sessão suas lembranças, inquietações, dores, de forma livre, sem julgamentos e o psicanalista ouve, faz a entrevista investigadora buscando criar ligação entre a fala do paciente e o seu inconsciente, as informações que ele sequer conseguiu trazer para a sessão. Voltando à paciente de Breuer, Anna O. – caso clínico publicado em 1895, a primeira tentativa foi de utilização de hipnose no tratamento. Posteriormente Freud se uniu a Breuer nesse caso e acessou o inconsciente da paciente por meio do método catártico e por meio da fala livre, de tudo o que viesse à mente, assim Anna eliminou afetos patogênicos e ab-reagiu, revivendo os acontecimentos que geraram tais afetos. Por meio da fala esses afetos foram eliminados e essa foi a primeira vez na história em que a loucura teve voz, em que a histeria não foi vista como uma questão de espiritualidade. Naquela época acreditava-se que as mulheres que apresentavam histeria apenas queriam chamar a atenção, mas Breuer e Freud acreditavam que estavam, de fato, eram histéricas, estavam doentes e precisavam de cura, ser ouvidas e, graças a eles, Anna O. foi tratada e conseguiu se ver livre da histeria.

Por meio da livre associação, enquanto o paciente fala o que lhe vem à mente, acaba entrando em contato com conteúdos inconscientes, passando a ter oportunidade de ab-reagir. Por meio da fala o paciente e psicanalista encontram uma válvula de escape para o “afeto estrangulado”, consegue colocar para fora, o que gera cura. A ressignificação desse afeto é que possibilita a cura, já que se a reação é reprimida, o afeto fica vinculado à lembrança que gerou a histeria. E essa reação pode ser um tipo de reflexo voluntário, desde lágrimas, raiva e até vingança. Se essa reação realmente flui intensamente, aquele afeto estrangulado desaparece e o paciente consegue verbalizar seus sentimentos, daí a linguagem substitui a ação e o afeto pode ser ab-reagido e ressignificado. Pela fala o paciente acessa os sentimentos que geraram os sintomas de histeria, porque passa a compreender a memória e tem condições de deixar essa memória no passado, deixa de revivê-la repetidas vezes no presente.

No caso Anna O., a paciente contribuiu bastante para o tratamento, por isso tornou-se um case dentro da Psicanálise. Pelo sucesso no tratamento de Anna, com a expressão dos sentimentos pela utilização da fala sem interrupções ou perguntas, isso se tornou um novo método na psicanálise. Como Freud observou, alguns pacientes não eram hipnotizáveis, por isso a fala tornou-se um método eficaz. Assim, a hipnose no tratamento foi ficando de lado, dando lugar à associação livre, regra fundamental da psicanálise.


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